Faltam 15 dias para os Campeonatos Nacionais de Corta-Mato, na sua 102.ª edição, que este ano irão disputar-se em Lagoa, dias 22 e 23 de novembro, na mesma pista que alguns dias depois receberá os europeus desta disciplina, agendados para 13 e 14 de dezembro.
Com mais de um século de história, os Campeonatos Nacionais de Corta-Mato são uma das competições mais emblemáticas e antigas do atletismo português. A primeira edição remonta a 1911, e desde então o corta-mato nacional tem sido palco de duelos lendários, não apenas entre atletas, mas, sobretudo, entre clubes que construíram equipas fortes, estáveis e capazes de transformar talento individual em conquistas coletivas.
As raízes (1911-1950): o início da rivalidade eterna
Os primeiros campeonatos revelaram a base do que viria a ser o eixo central do corta-mato português: Sporting e Benfica. Ainda assim, na edição inaugural, em 1911, foi o SC Império quem venceu, mas logo no ano seguinte o Sporting assumiu o comando. Nas décadas seguintes, Sporting e Benfica alternaram vitórias, com o Belenenses a intrometer-se como outsider ocasional.
Durante este período, o corta-mato era uma prova de resistência bruta, disputada em terrenos irregulares, onde a força física e o espírito coletivo pesavam tanto quanto o talento. Os clubes que conseguiam mobilizar mais atletas consistentes eram os que somavam mais títulos, um padrão que na realidade se mantém até aos dias de hoje.
1950-1980: domínio lisboeta e o aparecimento dos nortenhos
Entre as décadas de 50 e 70, o duelo Sporting-Benfica atingiu o auge. Os leões destacaram-se com vitórias sucessivas nos anos 60, consolidando-se como o clube mais vitorioso de sempre no crosse longo masculino. A hegemonia lisboeta só começou a ser desafiada quando o FC Porto, o Académico do Porto e o Belenenses começaram a apresentar equipas competitivas.
Este período foi também o da consolidação do corta-mato como “bastião” do atletismo nacional: a base da seleção portuguesa de fundo vinha quase sempre dos clubes que se destacavam coletivamente.
1980-2000: a era da democratização e o aparecimento do Maratona
Os anos 80 trouxeram uma nova dinâmica. O Maratona Clube de Portugal, fundado em 1982, começou a desafiar os grandes, apostando num modelo inovador de captação e desenvolvimento de atletas de fundo.
Nos anos 90, o Maratona quebrou o duopólio e tornou-se presença obrigatória nos pódios com nomes como Paulo Guerra ou Domingos Castro, que levaram o clube a títulos históricos.
Em paralelo, surgem também clubes-revelação como Conforlimpa, Terbel, NA Joane e o Maia AC, que demonstraram que uma boa estrutura técnica podia rivalizar com os colossos lisboetas. O corta-mato tornou-se, assim, uma montra nacional do trabalho de formação que permitia a descentralização para fora dos grandes centros.
2000-2024: novas forças, velhos rivais
O início do século XXI confirmou essa tendência de descentralização. O Maratona CP manteve-se como referência até meados da década de 2000, quando o Conforlimpa dominou várias edições seguidas. A partir de 2010, o Sporting voltou em força e recuperou o estatuto de potência, tanto no masculino como no feminino.
Nos últimos anos, a rivalidade entre Sporting e Benfica reacendeu-se, com as águias a vencerem coletivamente as três últimas edições, o Sporting venceu entre 2016 e2021, além de liderar em vários escalões de formação. O SC Braga consolidou-se como o terceiro clube mais forte do panorama atual, sobretudo no setor feminino, onde tem conquistado títulos e pódios consecutivos.
A edição de 2024 confirmou esta tendência: o Benfica voltou a vencer coletivamente no masculino, seguido do Sporting e do SC Braga. No feminino, o Sporting CP e o SC Braga mantiveram a disputa acesa, reforçando o estatuto de clubes-referência no corta-mato português.

Maratona – O mais titulado em femininos
A vertente feminina do corta-mato nacional teve início apenas em 1967, mas rapidamente se afirmou como um dos palcos mais competitivos do atletismo português. Ao longo de quase seis décadas, o Maratona Clube de Portugal tornou-se o nome incontornável da história coletiva, somando 20 títulos nacionais e definindo um padrão de excelência que marcou várias gerações de atletas. O Sporting Clube de Braga, com 12 conquistas, consolidou-se como o principal rival nas últimas décadas, seguido pelo Sporting CP (9) e pelo SL Benfica (8), que também deixaram a sua marca. O FC Porto, com 4 títulos, e o FC Foz, com 3, completam a lista de clubes campeões. A única exceção no historial foi 1975, ano em que o título não foi atribuído. Este percurso confirma que, também no feminino, a força coletiva e a continuidade estrutural dos clubes foram decisivas para elevar o nível competitivo do corta-mato português.
Em resumo, o corta-mato em Portugal é, pois, uma história coletiva de continuidade. Sporting e Benfica continuam a escrever essa rivalidade centenária no que diz respeito à competição masculina, mas o exemplo do Maratona, do Braga ou do Conforlimpa prova que o atletismo português vive do trabalho de base, da fidelidade à formação e da força de grupo.
No corta-mato, a glória é conquistada em equipa e é por isso que o coletivo continuará a ser o coração da modalidade.
| Campeões nacionais de Corta-Mato | |||
| Palmarés por clube (Masculino) | Palmarés por clube (Feminino) | ||
| Clube | Títulos | Clube | Títulos |
| Sporting CP | 49 | Maratona | 20 |
| SL Benfica | 26 | SC Braga | 13 |
| Maratona | 11 | Sporting CP | 9 |
| Conforlimpa | 6 | SL Benfica | 8 |
| CF Belenenses | 4 | FC Porto | 4 |
| Império | 1 | FC Foz | 3 |
| Vendedores Jornais | 1 | ||
| Académico FC | 1 | ||
| Gémeos Castro | 1 |
Mais informações (regulamento, programa-horário e histórico da competição) na página oficial dos Campeonatos Nacionais de Corta-mato. As inscrições já estão abertas no portal FPA Competições, para os nacionais seniores, sub-23, sub-20, sub-18 e sub-16 (competição no dia 23 de novembro), e também para os nacionais de veteranos, no dia 22 de novembro.
Fotos (arquivo 2024): FPA / Marcelino Almeida